Lá em casa sempre existiram duas regras: tirar boas notas e praticar algum esporte. Meus irmãos e eu podíamos escolher qualquer coisa — de luta livre a esgrima —, mas ficar em casa no sofá nunca foi uma opção.
Por isso, “treinar” sempre foi um verbo presente em minha vida. Natação, balé, jazz e ginástica rítmica fizeram parte da minha infância e adolescência, ensinando-me lições valiosas sobre disciplina, dedicação e trabalho em equipe. Mas com a faculdade, as tardes inteiras dedicadas aos treinos viraram uma lembrança do passado. Foi nessa hora que resolvi trocar as sapatilhas pelo tênis.
Nesses quase dez anos de corrida, já fui do revezamento 4×100 com barreiras, passando por corrida de aventura, até a minha preferida — trote pela orla no final da tarde. Mais do que treinos, esses sempre foram os momentos de esvaziar a cabeça, colocar as ideias no lugar, tomar decisões importantes e deixar o estresse ir embora junto com o suor.
Correr sempre foi a melhor das terapias, o remédio para dor de amor, de cabeça, gripe e até cólicas. A única coisa capaz de melhorar o meu humor em 30 minutos — e que eu podia levar comigo para qualquer lugar onde fosse possível calçar um tênis e sair por aí.
Tudo isso ficou ainda mais forte em 2012, quando fui diagnosticada com carcinoma adenoide cístico, um tipo raro e agressivo de câncer. De lá para cá, já foram três cirurgias e em breve vou encarar 33 sessões de radioterapia. Mas ficar boa é apenas um dos objetivos. Entre tomografias, ressonâncias e consultas, uma planilha me lembra que em outubro tem outra maratona me esperando. Porque treinar é a melhor forma de lembrar que a vida não pode parar, que ela segue, e vai seguir por muito tempo, um quilômetro de cada vez.
Clara Corrêa, 26 anos, é jornalista e mora em Salvador (BA).
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